Farmácia

Farmácia

O homem de meia-idade entrou na farmácia.

"Pois não?" - disse a atendente do balcão, solícita.

"Um tira de paracetamol, uma tira de Dorflex1, uma caixa de ibuprofeno, e uma caixa de nimesulida. Nimesulida é um anti-inflamatório, não?" - o homem exitou um pouco, enquanto fazia seu pedido...

A atendente se dirigiu às prateleiras da farmácia, e de lá trouxe os remédios solicitados.

"Algo mais?" - ela perguntou.

"Uma caixa de Buscopan." - o homem respondeu. Quem sabe além de dores ósseas, ele não estaria sob risco de alguma dor em "tecidos moles".
A atendente voltou às prateleiras, e de lá voltou o novo remédio pedido. "O senhor precisa de algo mais?" - ela perguntou.

"Uma caixa de Tilex." - o homem respondeu de pronto. Este é um remédio capaz de dopar um homem.

"Certo. A receita e a sua identidade, por favor." - a atendente pediu.

"Não tenho." - o homem respondeu.

"Sinto muito, mas este remédio é de uso estritamente controlado. Sem a receita não é possível lhe vender."

"..."

"Algo mais?" - a atendente perguntou, imaginando que aquilo fosse uma pergunta retórica, para concluir a venda dos analgésicos de venda livre.

"Sim. Uma caixa de paroxetina, e uma caixa de fluoxetina. "- o homem pediu.

"O senhor tem a receita?"

"Não" - disse o homem, e pensou que, já que estava pensando em suas dores, por que não levar também algo que aliviasse as dores de sua alma? Mesmo que às vezes algumas dessas substâncias lhe fizessem sentir como um zumbi...

"O senhor está brincando comigo? Estes também são remédios de uso estritamente controlado. Não é possível lhe vender sem a retenção da receita." - disse a atendente, já com ar de indignação. Mesmo assim, querendo finalizar a compra, por cortesia, perguntou ao homem: "Alguma coisa mais?"

"Quanto custa uma ampola de morfina?" - perguntou o homem.

"Senhor, nós não trabalhamos com morfina. É uma medicação com alto poder viciante. Mais forte que o Tilex, que o senhor já pediu." - o tom de indignação da mulher aumentou. "O senhor precisa de alguma coisa mais? Alguma vitamina?"

O homem soltou um suspiro de enfado. "Não. O que me foi permitido, é tudo que vou levar." Pensou consigo mesmo que havia lido em algum jornal que "a gente sabe que chegou a uma certa idade quando começa a frequentar mais as farmácias que os bares".

Pagou os remédios, e foi embora.

Enquanto caminhava, pensava nas propagandas de remédio na TV: "Se persistirem os sintomas, procure um médico."




26/04/2011.

1As marcas de remédio citadas neste texto são de propriedade dos laboratórios que os produzem, mas amplamente conhecidas. Por isso a citação.

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