Leituras atrasadas - Cartas da Zona de Guerra, de Michael Moore


Leituras atrasadas - Cartas da Zona de Guerra, de Michael Moore



Quem conhece a obra de Michael Moore, sabe que ele é um realizador um tanto quanto espalhafatoso. Seus diversos documentários o mostram tentando constranger os possíveis causadores dos infortúnios mostrados nos filmes, enquanto os entrevista. Esses documentários incluem "Roger e Eu" sobre a desativação de uma planta da General Motors em Flint, estado de Michigan, desativação esta que causa uma hecatombe econômica na cidade; "Sicko" sobre os problemas do sistema de saúde, ou a falta de um sistema público de saúde, nos Estados Unidos; "Tiros em Columbine" sobre o massacre perpetrado por dois adolescentes em uma escola no estado Colorado e a facilidade da venda de armas nos Estados Unidos; entre outros filmes.

Sua obra inclui também livros, como este "Cartas da Zona de Guerra", que é uma compilação de cartas, na verdade e-meios, de militares, ex-militares e familiares de militares dos Estados Unidos, e na invasão do Iraque, que era recente então.

A obra complementa o filme "Farenheit 9/11", e tem um objetivo de fundo, impedir a reeleição do presidente George W. Bush, então em primeiro mandato. Ambas as conclusões podem ser aferidas a partir das várias citações do filme, e das várias manifestações dos autores das mensagens de votar para impedir a reeleição de Bush. Assim fica claramente parecendo algo de política interna dos Estados Unidos da América. Como sabemos esse objetivo de fundo fracassou.

Afora isso, o livro demonstra algumas coisas interessantes.

Uma delas é que as queixas em geral vêm dos militares de baixa patente. Em geral são de soldados, ou de cabos, ou de seus familiares as mensagens que compõem o livro. Pela minha conta, só em uma das mensagens foi relacionada a um oficial, ainda assim de baixa patente. Ou seja, não há formados nas academias militares dos Estados Unidos escrevendo para Michael Moore. Além disso, esses militares, ex-militares e familiares que escrevem são pessoas pobres, que ingressaram no serviço militar voluntário, como uma forma de conseguirem juntar dinheiro para cursar faculdade, ou mesmo para aprender algum ofício durante sua estadia nos quartéis. Muitos relatam terem se sentido enganados pelos recrutadores das forças armadas, que prometem mundos e fundos, inclusive uma remotíssima chance de ir para alguma frente de batalha, e, após alistados, essas pessoas descobrem que sim, irão para uma guerra, alguns deles morrerão lá, alguns voltarão incapacitados, muitos voltarão com estresse pós-traumático, e todos terão poucos recursos aos quais recorrer após o serviço militar.

O livro apresenta um certo quadro. Ser soldado do exército ou da infantaria da marinha ("marines") dos Estados Unidos, é ser pobre, ou classe média baixa, em busca de oportunidades de crescimento profissional ou econômico. É comum também que algum outro familiar tenha prestado, ou preste, serviço militar. E também, em geral, significa ser conservador e votar no Partido Republicano.

Contudo, há uma outra questão. Como já foi dito, a missão de não reeleger George Walker Bush falhou. Além disso, o livro apresenta dezenas de mensagens de apoio a Michael Moore, à sua obra, e denunciando a Guerra no Iraque. Mas quantos milhares de outros militares, ex-militares e familiares de militares não se identificaram com a mensagem de Michael Moore e continuaram apoio o então presidente Bush, sem questionar a guerra? Sobre isso só podemos especular.

Por fim, cabe dizer, que em vista dessa questão da Guerra do Iraque, e da reeleição de George W. Bush o livro está um tanto datado. Esse, aliás, é o motivo pelo qual o título deste texto começa com "leituras atrasadas". Teria sido melhor que ele tivesse sido lido antes da eleição de 2004, nos Estados Unidos.




MOORE, Michael (org.). Cartas da Zona de Guerra. São Paulo: Francis, 2004.




16/05/2012.


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