O mundo acabou


O mundo acabou


O mundo acabou.

Foi em 21 de dezembro, no solstício de dezembro do ano de 2012.
De repente, sem que nenhum dos vários telescópios espaciais espalhados pelo planeta percebessem, um imenso asteroide colidiu com o Planeta Terra. O asteroide caiu na Sibéria, Rússia. Com o impacto, uma cratera como nenhuma já vista antes surgiu. Terremotos decorrentes do impacto arrasaram cidades da Rússia, e dos países da Ásia Central. Um maremoto decorrente do impacto varreu o planeta. Centenas de cidades litorâneas foram inundadas e parcialmente destruídas. Centenas de milhões morreram. Os prejuízos se tornaram incalculáveis. A população sobrevivente não sabe por onde poderia reiniciar suas vidas.

O mundo acabou.

Um corpo celeste imenso que passou muito próximo da Terra, alterou sua órbita gravitacional, e modificou seus polos. A alteração de localização dos polos gerou ventos da ordem de centenas de quilômetros por hora, que derrubaram diversas construções com milhões de mortos. O tsunami decorrente de alteração da órbita do planeta varreu centenas de cidades litorâneas, causando inundações e destruição. Os prejuízos são incalculáveis. A parcela da humanidade sobrevivente, perplexa, não sabe por onde tentar reiniciar suas vidas.

O mundo acabou.

No dia 21 de dezembro, no solstício do inverno, uma pandemia surgiu na China. Dezenas de pessoas com sintomas semelhantes a de uma pneumonia aguda foram afetadas. Logo a situação derivou para uma crise aguda de saúde pública. A letalidade da síndrome estava na ordem de cinquenta por cento. Muitos dos trabalhadores do setor de saúde também estavam sendo afetados. Logo outros países começaram a colocar em quarentena viajantes oriundos da China. A medida não foi suficiente, ou chegou tarde. Logo os primeiros casos estavam sendo registrados em Taiwan, no Japão, no Vietnã e na Austrália. Um dia depois havia pessoas infectadas no Chile e no Peru. Simultaneamente, os primeiros casos surgiram na costa oeste dos países da América do Norte. Poucos dias se passavam entre a manifestação dos sintomas e o óbito. Mas também a recuperação dos que sobreviviam à síndrome era relativamente rápida. Cidades pararam para tentar evitar aglomerações que facilitassem o contágio. Tempos depois laboratórios divulgavam notícias que o vírus causador da síndrome parecia conter elementos tanto da chamada gripe aviária, quanto da gripe suína. Apesar das quarentenas e da redução da atividade econômica, logo foram encontradas vítimas da síndrome na Europa e nas costas lestes das Américas. As perdas econômicas decorrentes tanto da redução das atividades nas cidades, quanto da perda de pessoas qualificadas foram imensas. Milhões de pessoas sucumbiram à síndrome. Novas áreas tiveram que ser alocadas para cemitério às pressas.

Na noite de 21 de dezembro, João morreu. Ele morava em São Paulo, era um jovem de seus vinte anos. Naquela sexta-feira ele tinha acabado seu expediente de balconista, numa farmácia no Centro da cidade. Voltara para casa na periferia, e no caminho para casa encontrou amigos que estavam tomando cerveja no bar. Sentou-se junto deles. Sexta-feira, parcela do décimo-terceiro no bolso, "happy hour". Estavam na quinta ou sexta cerveja quando uma moto com dois ocupantes parou em frente ao bar. O carona desceu. Sem tirar o capacete sacou uma pistola e começou a atirar contra os fregueses do bar. Oito morreram, inclusive João e dois de seus amigos. O mundo acabou para João. Se tornou um inferno para seus familiares.

No dia 21 de dezembro, dona Candinha morreu. Ela havia nascido nesse mesmo dia, em 1922. Estava com exatos 90 anos portanto. Os médicos atestaram falência múltipla de órgãos. Ela tinha sido baixada no hospital em Santa Maria com dificuldades de respirar, dores nas costas e febre, naquele dia quente e abafado que marcava o início do verão alguns dias antes. Durante a internação seu quadro piorou. Por fim morreu. Filhos e netos estavam no hospital no momento de sua morte. Comentavam que ela dizia que tinha vivido uma boa vida. Nunca tinha passado fome, nunca ficara ao desabrigo, e inclusive teve dias de ir visitar a capital do estado, e até conseguiu conhecer o mar...O mundo dela era pequeno. Ela teve medo que tudo acabasse no advento do ano 2000, mas, então, nada acontecera. Não no ano 2000. O mundo de dona Candinha acabou naquele dia, 21 de dezembro.

Na manhã de 22 de dezembro de 2012, Daniel acordou. Daniel era um homem de meia idade. Já tinha trabalhado mais tempo que o tempo que faltava para a sua aposentadoria. Ele morava em Canoas. O rádio-relógio que ele usava como despertador estava funcionando desde a noite da véspera, sintonizado na rádio especializada em notícias que Daniel costumava escutar. No noite anterior, intrigado com as especulações a respeito de uma possível previsão do fim do mundo, segundo algumas interpretações de um calendário da antiga cultura maia pré-colombiana, ele ficou ouvindo o rádio até o início da madrugada. As notícias informavam de alguma morte em acidente de trânsito, algum cadáver encontrado pela polícia, chuvas torrenciais em alguma parte da Ásia, e um inverno inclemente em algum país da Europa. Mas nada tão extraordinário. Nem asteroides, nem terremotos para além da escala Richter, nem tsunamis... Nada de extraordinário. Depois de ter aberto os olhos, e ter certeza que estava acordado, Daniel constatou que o mundo continuava lá fora. Daniel suspirou, e pensou, entre seus lençóis, “Parece que não vai ter jeito. Segunda-feira vou ter que acordar cedo de novo, para trabalhar...”






18/12/2012.



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