Leituras na Piauí - Junho de 2014 - "Eu, um Velho", de Roger Angell


Leituras na Piauí - Junho de 2014 - "Eu, um Velho", de Roger Angell



"Eu, um Velho" é um artigo, originalmente publicado na revista americana New Yorker, onde o autor relata um pouco do que é estar vivendo na décima década de vida, isto é, estar vivendo aos noventa e poucos (ou noventa e muitos, isso não fica claro no texto) anos. É um relato fluido e humano. De alguma forma é uma espécie de privilégio que o autor tenha lucidez para fazer todo este longo relato sobre ser muito velho.


Ele começa falando, como se poderia esperar, das dores físicas. Os dedos retorcidos, parecendo marcas de uma antiga sessão de tortura, por conta da artrose. A cegueira parcial em um dos olhos por conta de degeneração macular. As dores e os desvios da coluna que lhe tiraram alguns centímetros de altura. O uso diário e necessário de analgésicos para seguir adiante, por conta de dores nas pernas. A cirurgia para válvula no coração. Há todo um leque de procedimentos de saúde pelo qual passou e passa diariamente uma pessoa com mais de noventa anos.


A sensação, como ele diz, de andar com um piano ou um cofre pendendo sempre sobre a cabeça onde quer que ele vá, como metáfora da possibilidade da morte a qualquer instante.

E, apesar, de tudo, uma relativamente boa relação com a morte. Uma atitude mais serena em relação à indesejada das gentes que quando ele tinha cinquenta ou sessenta anos.


E depois disso, pensar na morte dos conhecidos, na morte dos amados. Angell fala das lembranças, começando pelo mais recente cachorro. Mas também de uma filha que partiu antes dele. Pensa no pai, ou na mãe. Em amigos. Enfim, eu posso imaginar. Se com quarenta anos já sentimos a morte de tantos queridos em nossa vida, imagine com noventa. Talvez se seja o último remanescente de toda uma geração.


E há a invisibilidade de ser velho. Ele diz que acha normal ele ser excluído, ou não incluído, quando tenta se aproximar de outras pessoas mais jovens que ele conversando. Mesmo que sejam pessoas com sessenta anos. Ele diz que é como se os mais jovens dissessem para ele, "o seu tempo já passou, meu velho. Deixe nós com nossas atividades e nossos assuntos."


Por fim, aos noventa e tantos, Angell se diz surpreso com duas coisas.


Uma é justamente chegar a tal idade. Cada dia novo vivido é uma espécie de surpresa.


A outra é a permanência do desejo. Desejo que não necessariamente é sexual, como genitalizado. Mas o desejo de ter alguém do lado. De não estar só. Como ele diz, de haver uma coxa encostando na sua quando você está deitado na cama.


Por tudo, um depoimento comovente e muito humano. Vale a pena ler o artigo.



O artigo original: “Eu, Um Velho”, na Piauí.



07/08/2014.

Comentários

  1. Olá, Zé Alfredo, show de bola saber que o texto do Roger Angell sensibilizou você também.

    Grande abraço.

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