Caminhando na Vila Cefer


Caminhando na Vila Cefer



No dia da votação do primeiro turno das eleições, eu me dirigi à Vila Cefer para votar. A minha seção fica na Escola Ibá Ilha Moreira, na Vila Cefer I.


E talvez eu esteja ficando velho, pois caminhar por ali, me trouxe uma série de recordações de anos anteriores, dos anos que eu lá morei.


Talvez seja sinal de que a gente vai ficando velho.


As Vilas Cefer, I e II, são antigos projetos de habitação popular, concebidos durante a ditadura. Centenas de casas de madeira, com banheiros de alvenaria, todas iguais. Foram inauguradas no final da década de 1960, como um condomínio fechado popular.


Posteriormente a ideia de condomínio foi abandonada, mas até hoje os logradouros são denominados em números. E por conta desta configuração de condomínio a numeração das casas costuma ser em sequência em ambos os lados das ruas, em lugar de uma calçada com números pares e a outra com números ímpares, como é comum. E se entra em ambas as vilas pela rua "Um". As vilas são morro acima. Assim chegar na rua Onze, ou Cinco, as mais altas, pode ser bem cansativo.


Há uma linha de ônibus que sobe entrando pela Rua Um da Vila Cefer II, passa rua Nove da mesma vila, e volta pela longa Rua Um da Vila Cefer I.


Quando minha família se mudou para lá, na metade da década de 1970, a Cefer parecia um lugar relativamente próspero, com várias famílias com crianças, algumas com seus volkswagens.


Quando criança, na minha turminha, nós achávamos que lugar sinistro devia ser a Vila Pinto, favela vizinha, encravada entre a Cefer II, a Vila Brasília e a Vila (Bairro?) Bom Jesus. Levou tempo para eu perceber que éramos pobres estigmatizando quem era ou parecia ser mais pobre que nós. E lembro que uma vez foi um choque quando fui jogar botão (futebol de mesa) na casa de um colega de turma, e percebi que a casa dele era uma casa na Vila Pinto, no limite entre esta e a Cefer 2. Não houve problema, Jogamos botão e nos divertimos naquela ocasião.


E uma das peculiaridades da Cefer II é ter logradouros que não são ruas, mas tem casas, chamados de acessos. Esses acessos permitem uma série de atalhos para pedestres, mas neles os carros não devem passar. Ou não deveriam. Muitos moradores construíram garagens nesses acessos, e obviamente os automóveis trafegam por ali para chegar nessas garagens.


Hoje em dia, a Cefer vive uma próspera decadência.


Muitos proprietários alteraram os projetos originais (inclusive minha irmã), transformando as antigas casinhas de madeira, em casa de alvenaria. Algumas destas transformações inclusive levaram à construção de sobrados com dois pisos.  


Umas poucas casas incendiaram ou ruíram. Uma das que ruíram foi a de meu colega da terceira série do antigo primeiro grau, o Sílvio. A casa ficava bem em frente à escola da Cefer II, a Escola Evaristo Gonçalves Neto. O curioso é que o Sílvio era um dos "riquinhos" da turma, aquele que mais aparecia com roupas e tênis novos, cuja roupa era sempre limpinha e engomadinha. Naquele tempo, faz mais de trinta anos, parecia que a casa do Sílvio estava sempre com uma mão de tinta nova. Hoje restam as ruínas daquela casa num terreno semi-baldio.


Na Rua Dois, da Cefer I, uma casa incendiada permitiu que a casa ao lado ficasse com um pátio bem maior do que é o padrão dos quintais da vila.


E há o beco que serve de caminho entre a Cefer I e a Cefer II. Só para pedestres. Uma ponta fica na rua 2 na Cefer I, e a outra na rua 8 da Cefer II.


E a gente fica pensando em quando era criança: "Huummm... aqui era a casa dos avós do Marquinhos (e provavelmente ambos já faleceram)."


"Um pouco mais adiante era a casa da família do Marquinhos. Será que alguém da família ainda mora lá? Acho que não."


"E aqui nesse beco está a casa que era dos pais do Pardal. Puxa, os novos proprietários fecharam a entrada da casa pelo beco!"


No centrinho comercial da Cefer I, um bar com grades substituía um minimercado, e a farmácia que havia ali fechou, dando lugar a um armazém.


Grafites e pixos adornam os muros e paredes. Quando não há isso, há os tijolos de seis furos à mostra, ou o reboco de cimento cru, ou o musgo que cresceu por cima...


As casinhas já não são todas iguais, nem de madeira. A Cefer vive uma próspera decadência.


E eu vou ficando velho...


22/10/2014.

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